O Tribunal de Justiça de Mato Grosso deve adotar medidas que assegurem uma efetiva reparação aos consumidores, em especial os mais idosos, nos julgamentos de ações contra empresas, pessoas e instituições comerciais, bancárias e financeiras processadas por causarem prejuízos, aplicar golpes ou efetivar contratos mediante fraude. O tema foi pauta de reunião entre a presidente do Conselho Estadual dos Consumidores de Mato Grosso (Condecon-MT), Joeli Mariane Castelli e a presidente do TJMT, desembargadora Clarice Claudino da Silva. A reunião ocorreu no último dia 22 na sede do Judiciário Estadual.
Participaram da reunião, solicitada pelo Condecon-MT, representantes da Delegacia de Defesa do Consumidor, Procon-MT, Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec) e da BPW Cuiabá.
Durante o encontro, foram apresentados dados à presidente do TJMT que demonstram um aumento sistemático e constante no número de reclamações de consumidores contra instituições bancárias e financeiras – em grande parte apresentadas por pessoas idosas – que lesaram consumidores em Mato Grosso. Durante todo o ano de 2022, foram registradas 6.709 contra bancos, financeiras e administradoras de cartão de crédito. Já este ano, até o mês de setembro, haviam sido registradas 5.979 reclamações.
A preocupação do Condecon e das demais entidades de defesa do consumidor que atuam em Mato Grosso é com o fato da baixa resolubilidade das ações impetradas na Justiça contra estas instituições e o elevado número de decisões que dão ganho de causa às mesmas, obrigando os reclamantes a absorverem prejuízos financeiros pesados, mesmo quando as situações envolvem claramente o uso de propaganda enganosa, engodos e artifícios legais aplicados de má-fé por parte das corporações do sistema bancário e financeiro.
Durante a reunião, a comissão reivindicou do Poder Judiciário os aprimoramentos nos processos de julgamento, com particular ênfase nas queixas contra instituições bancárias, a fim de contrabalançar as forças entre estas e os consumidores. Atualmente, é desproporcional o aparato de defesa das instituições se comparado com a capacidade dos consumidores de provarem que foram vítimas de esquemas lesivos como imposição de contratos draconianos, empréstimos e financiamentos indesejados, juros abusivos, fraudes de diversas natureza e cobranças indevidas ou exageradas.
“Nós, do Condecon-MT, solicitamos essa reunião com a presidente do Tribunal de Justiça porque temos nos deparado com julgamentos que não refletem a realidade do consumidor. São muitas ações julgadas improcedentes porque os bancos apresentam contratos que as pessoas teriam assinado, mas que não refletem as promessas feitas para o cliente. Sabemos como funciona as técnicas de assédio e os idosos, em especial, acabam se deixando levar pela conversa”, salientou.
A presidente do Condecon-MT lembrou ainda que os consumidores mais idosos têm dificuldade natural para lerem os contratos e para entenderem a real dimensão dos custos financeiros e condições daquilo que estão lhe oferecendo. “Muitas vezes, essas pessoas são lesadas ao serem induzidas a assumir compromissos impossíveis financeiramente, ou simplesmente, caem em golpes e fraudes. Infelizmente, depois, elas não encontram no Poder Judiciário a reparação do dano”, lamentou Joeli Castelli.
Diante desta realidade, a presidente do Condecon-MT acredita ser necessário que o Poder Judiciário não se prenda somente ao legalismo e às formalidades que concede à aspectos burocráticos a representação do que seria a realidade das relações fornecedor-cliente. “A nossa intenção em buscar essa aproximação com o Tribunal de Justiça foi levar ao Poder Judiciário conhecimento da realidade concreta dessas pessoas. Num processo isso não é possível de ser demonstrado. O Poder Judiciário precisa estar mais próximo da sociedade, do Condecon, do Procon e da Delegacia do Consumidor. O judiciário precisa considerar a necessidade de cruzamento de informações para que de fato, possa decidir nas ações, identificando aquelas empresas que, de fato, possuem em sua prática rotineira a política de lesar o consumidor. Só assim elas serão efetivamente punidas de forma mais severa, numa proporção punitiva e pedagógica para que não volte a ter a condutas criminosas”, explicou Castelli.
Conforme destacou a presidente do Condecon-MT, o consumidor merece respeito, principalmente a população idosa que não tem afinidade com a tecnologia e é induzida a contratar empréstimos que não querem e em condições que não podem arcar economicamente.
“Existem casos em que não houve vontade do consumidor em contratar e as empresas utilizam imagens de selfie com documento e usam isso como prova de contratação, o que infelizmente vem sendo aceito pela justiça para dar ganho de causa às financeiras. Está claro que o Judiciário deve buscar informações com as entidades de defesa do consumidor, que abra espaço para se investigar caso a caso para que a verdade real seja aplicada nos julgamentos e assim, garantir que a verdadeira justiça seja feita”, ponderou.
Ainda segundo a presidente do Condecon-MT, os juízes precisam entender de uma vez que existem duas verdades: a verdade vivenciada no plano das relações concretas e a verdade burocrática do processo que é o que vem sendo aceita como única prova absoluta. “O que esperamos é que a verdade real seja reconhecida [pelo Judiciário]”, concluiu Castelli.
REDE DE PROTEÇÃO E DEFESA DA PESSOA IDOSA
As dificuldades da população idosa nas suas demandas junto ao Poder Judiciário é uma das questões que preocupa o presidente do Sindicato dos Aposentados, Pensionistas e Idosos de Mato Grosso (Sindapi-MT), Francisco Delmondes Bentinho. A entidade, em conjunto com o Conselho Estadual de Defesa de Direitos da Pessoa Idosa (CEDEDIPI-MT), tem feito gestões junto ao TJMT a fim de que seja estabelecida uma política de padronização de condutas dos magistrados na condução de ações que envolvam os idosos.
Segundo Bentinho, a ação coordenada do Condecon-MT vem ao encontro dos esforços do Sindapi-MT e do Cededipi-MT para implantar em Mato Grosso a Rede de Proteção e Defesa das Pessoas Idosas. “Toda iniciativa que vise assegurar que o Judiciário de Mato Grosso olhe com mais atenção às causas da população idosa merece nosso apoio e nosso aplauso”, disse Bentinho sobre a reunião da comissão liderada pelo Condecon-MT com a presidente do TJMT, desembargadora Clarice Claudino. “Estamos acompanhando com otimismo esses entendimentos e torcemos para reprodução em ações de Justiça efetiva em favor dos consumidores idosos”, afirmou o presidente do Sindapi-MT.